Aquilo que me inspira, levo para casa.




30.9.15

Ritmos de festa



Há festa sempre que os olhos se engraçam ou as ideias antevejam motivo para celebrar. 

Há festa sempre que as ruas se enfeitam e os braços se ajeitam para mais bem segurar. 

Trazer pela cintura a alegria da música, a compleição das virtudes, o traquejo da felicidade. 

Estar em festa, é estar com a vida, com os prantos a cantarem baixinho e as notas soltas a comporem árias de amor. 

Festa, testa, nesta, sesta, resta, diferentes inícios, idênticos sons. Assim pode ser a festa, cheia de tudo, vazia de nada, num gargalhar que perdura a saber respeitar os ritmos de cada um. 

Vale a pena ser a festa, estar em festa, andar de festa em festa porque a celebrar se constrói mundo. Não precisa ser de arromba desde que o seu significado encontre aquilo com que festejar. 


23.9.15

Mono no aware ou a nostalgia japonesa


Acabou o Verão e geralmente este é o momento do ano em que a passagem de estação nos causa maior impacto, apesar do Outono ser também prezado por muitos. O Inverno é a estação menos desejada e traduzível por dias pequenos, chuvosos, de cor cinza e que roubam aos humores, muita da sua candura. Contudo, não seria de apreciar todos os momentos do ano, com igual abertura de afectos? Por que razão teimamos em não ver beleza num dia de chuva e a atribui-la somente a dias em que as nuvens permitem ver o sol? Por que razão não apreciamos a sazonalidade, e o caracter efémero que esta nos oferece, dando valor, precisamente, à transitoriedade de cada época.

Os japoneses dão o nome de mono no aware à percepção de que os mais belos momentos da vida vêm logo antes desse momento terminar. Esta aceitação plena do estado transitório e temporal das coisas faz com que o apreço pelo eterno não seja generalizado. O florir das cerejeiras é visto como mais belo precisamente porque apenas ocorre na primavera, naquele momento preciso e não pela eternidade.  O mono no aware relaciona-se com os significados mais profundos e menos evidentes das coisas, é poesia e assombro. Nesta linha de pensamento, o final do Verão não deverá ser lamentado mas sim vivido com a alegria que deve forrar tudo aquilo que termina.

Nem sempre isto é fácil, apesar dos início e dos fins serem muitas vezes cíclicos, como o são, efectivamente, as estações do ano ou o florir das árvores, na verdade muitos dos fins são irreversíveis, não dando espaço para que a esperança actue e criando de forma indelével aquilo que os portugueses tão bem conhecem, a saudade.  A nostalgia é conotada frequentemente com a tristeza que fica quando se perde algo que se gosta. Já dizia a Menina do Mar de Sophia de Mello Breyner “Na terra há tristeza dentro das coisas bonitas.Tendo como resposta “Isso é por causa da saudade (…) A saudade é a tristeza que fica em nós quando as coisas de que gostamos se vão embora.”

O conceito de Mono no aware pressupõe consciência da transitoriedade das coisas e uma apreciação acurada da sua beleza efémera acompanhada por uma tristeza suave ou melancólica. Embora a própria beleza seja um conceito eterno, as suas manifestações particulares são únicas e especiais, porque não podem por si mesmas, ser preservadas ou recriadas.

Gosto de pensar que a tristeza da despedida de algo pode ser compensada pela beleza que esse algo nos proporcionou e que por isso, cada momento é eterno na saudade que deixa e deve ser vivido com consciência de que, ao acabar, só nos restará a saudade de ter sido vivido em pleno. 

22.9.15

De pernas para o ar

As perspectivas, quando tidas em conta, são excelentes protectores da intolerância e óptimos catalisadores de mudanças. Ver de pernas para o ar é a metáfora perfeita para ilustrar o acto de sair do lugar e olhar para algo de uma outra forma, no sentido de o considerar em vez de o censurar. Quantas barreiras possuímos que, de maneira automática, nos trancam para determinados assuntos, não nos permitindo ver para além do modo usual com que analisamos e percepcionamos o mundo (quantas vezes míope e tacanho). Seria bom que de vez em quando nos deixássemos inverter e fizéssemos o pino às nossas ideias para que estas, mais facilmente, se desconstruíssem e pudessem formar novas ligações mais prazerosas e certeiras. 

Ver prédios que caem do céu não é natural, mas o sentido figurativo que lhe damos bem como a perspectiva de beleza que lhe podemos atribuir, fazem dessa ideia algo considerável e não censurável. Toda a expressão artística passa por testar perspectivas, por que não fazê-lo com as ideias abandonando a pré-concepção destas e apostando numa pós-concepção onde as mesmas são desfeitas e refeitas sobre outros prismas? 

O mundo de pernas para o ar não tem de significar caos mas antes ver como nunca se tinha feito para que legitimamente se valide a visão que se quer defender.


8.9.15

Ser leve



Leve é a palavra que me define os momentos. Não quero mais carregar pesos que não suporto. Não quero esforçar os músculos com aflições que acumulo. Quero leveza, subtileza, voar por entre concretizações. Encher a casa com flores, regar os jardins que planto nas minhas vivências e sentir o meu respirar, leve.  

Por toda a vida damos abrigo a pesos no peito. O peso da maturidade, o peso da responsabilidade, o peso das decisões, o peso das preocupações, o peso dos medos, o peso da vergonha, o peso da culpa. Para que serve carregar tanto peso tornando o equilíbrio tão difícil? Ser leve é saber libertar todas as amarras e ter uma estrada onde se possa correr.

Quero ser amiga da balança, dos desejos e da esperança. Quero não sentir o peso do meu corpo mas somente o de uma mente cheia, de alegrias. Quero ser tola, quero ter o mundo nas mãos, quero escrever esse mundo. Quer ar, respirar, abraçar, sonhar, viajar, falar, amar e por isso ser leve, pluma num mundo pesado, boiar, levitar, andar, gota de água num mundo de chumbo.

Relativizar, Aceitar, Apreciar, Perdoar, Agradecer, Viver. 
Ser leve.