Aquilo que me inspira, levo para casa.




22.5.17

Estou sentada em cima da caixa que guarda as minhas palavras. Desconfio que a caixa transborda mas o meu peso não permite que esta se abra. As palavras são pacientes. Feitas daquela tolerância que, em tantos momentos, foge do mundo. Sei que aceitam esta clausura porque mantêm a esperança na liberdade que as espera.

Porém, sem que eu lhes diga, assumo que nem sempre sei o que fazer com elas. Sinto-me a reunir significados, coisas bonitas, um mundo que me chega pelos sentidos. Coleccionáveis que junto na minha memória e me oferecem o ar com que respiro e mantenho aberto o meu coração. Mas as palavras- ais as palavras- teimo em remetê-las para a caixa, em sabê-las mudas e quietas porque não transparecem aquilo que guardo com tanta limpidez. Porque as acho pobres, diminutas, incapazes de exprimir aquilo que sinto, as emoções intrincadas de quem tem tudo à flor da pele.
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Quando observo o mundo, sinto-as ganhar uma nova vida, pressinto-lhes a dança que as entontece, sinto-lhes a avidez de se oferecerem à minha reflexão. Engano-as, contudo, persistindo no silêncio, conjugando firmemente o verbo calar, porque escuto sem palavras e vejo com palavras a mais. 

E enquanto brinco neste jogo de palavras - escondidas, sossegadas, insufladas de mundo visual - eis que as liberto de forma serena, ao compasso de uma inspiração tímida, ao encontro de uma vontade de tons ténues.