Tenho 15 ou 16 anos e estou sentada
no chão da sala. Por baixo de mim sinto a alcatifa. Ao meu lado espalham-se
discos de 45 e 33 rotações prontos a serem escolhidos para o toque da agulha. Nos meus ouvidos pousam uns headphones que vibram ao som da música. O meu pai lê o jornal sentado na sua cadeira. Provavelmente
conseguirá ouvir algum resquício do som que foge em decibéis elevados mas ignora-me
a mim e aos esgares que faço enquanto mentalmente soletro a letra da música. Oiço as faixas que mais gosto em modo repeat sem nunca cansar os meus
receptores auditivos. Imagino-me nos mais diferentes ambientes a dançar aquele
mesmo som e projecto toda uma série de situações ficcionadas. Neste momento, sou
eu e a música que enchemos o meu mundo. E bastamos. Nada mais importa porque o
resto é um mero excedente.
Hoje, duas décadas distam da
recordação narrada. Já não tenho discos de vinyl, o gira-discos repousa em
descanso na garagem e há muito que não piso alcatifa. Do meu pai, sentado na sua cadeira, somente guardo lembranças. Mas a música ainda me acompanha. O seu efeito simbiótico
permanece. Os headphones continuam a
merecer destaque na minha vocação hedonista.
Mudam-se os tempos mas a essência
fica.
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