Aquilo que me inspira, levo para casa.




30.11.15

Pode parecer confuso mas para mim faz sentido...



Hoje estou assim, cheia de mundo. A querer deitar para fora tudo quanto guardo comigo para construir pontes, estradas, caminhos e tudo o que possa ligar aquilo que estando à solta nunca será livre. Pode parecer uma contradição mas existem coisas que soltas nunca serão nada, precisam de uniões e de parcerias para conseguirem evidenciar o esplendor daquilo que valem. Já tinha visto que isto sucedia com as palavras, mas não são estas apenas a sucumbir a este imperativo, também as ideias necessitam de outras para instalarem alianças coesas.

Cada uma vale por si mas juntas dão significado. É assim com tanto deste mundo que nem percebo por que razões se afastam palavras e ideias quando juntas transformariam prosas em poesias e pensamentos em causas. Quão mais fácil seria este mundo menos compartimentado e egoísta se deixássemos que as palavras e as ideias se encontrassem tal como o amor romântico privilegia os encontros e os acasos que acabam por perpetuar sentimentos. 

Não existem verdades absolutas mas existem visões mais próximas daquilo que é sustentável e que deveriam prevalecer nas acções de todos. Sou tão pelo encontro de ideias e de palavras que me esforço diariamente por favorecer estas uniões por forma a dar significado ao que faço, digo e vivo. 

Nem sempre é fácil, nem sempre é pacífico o encaixe entre ideias opostas ou palavras que se anulam mesmo que sejamos nós os criadores destas dissonâncias. Mas aprendemos a facilitar esta convivência. Torna-se tão insuportável e incoerente viver neste desconcerto, que tratamos de lhe dar solução rápida e reparar a paz perdida. Mais difícil ainda será quando queremos simplesmente melhorar ideias, traçando um caminho de uma ideia original até ao produto final. Como não existe dissonância, tendemos a procrastinar na solução rápida, adiando o desfecho ou explorando a ideia inicial sem procurar a que lhe aumente o mérito. Mas acabamos por conseguir chegar.  É importante termos o mundo em nós para que o processo se amenize.

Mas a verdadeira vitória decorre do encontro entre o que é nosso e o que é dos outros, aqui sim são postos à prova todos os valores e atributos que revestem a humanidade. Quem acumular no seu histórico o maior número de encontros entre palavras e ideias suas e de terceiros estará em forte simbiose com o mundo.

2.11.15

Das rotinas e de outros argumentos

Como quase toda as pessoas, gosto que concordem comigo, gosto de observar o movimento afirmativo na cabeça do meu interlocutor enquanto defendo alguma ideia, dando-me a entender que esta é partilhada. Contudo, a troca de argumentos contrários pode ser bastante enriquecedora caso, claro está, sejam cumpridos os critérios necessários para uma discussão séria, honesta e intelectualmente estimulante.

Há algum tempo discutia com uma pessoa acerca da importância das rotinas. Esta pessoa defendia-as avidamente, dizendo que não seria possível vivermos sem elas já que são as rotinas que asseguram o equilíbrio necessário para continuar a viver. A ausência de rotinas levaria, de acordo com o meu interlocutor, à loucura e à incapacidade de resistir ao dia-a-dia. Esta perspectiva, demasiado fundamentalista, ia sendo refutada pelos meus argumentos que incidiam no facto de, efectivamente, as rotinas serem necessárias mas somente até um certo ponto, estando na inovação dada aos dias, muita da felicidade encontrada.

A conversa durou alguns minutos sem que ninguém tivesse saído vencedor, na medida em que cada um permaneceu com as suas ideias iniciais intactas. Porém, este episódio teve em mim o efeito de me deixar a pensar. Realmente as rotinas têm em papel benéfico na gestão dos dias e permitem-nos ter tempo e controlo sobre a vida. Porém não me faz sentido que possamos viver unicamente com base nestes comportamentos repetitivos e pouco estimulantes.

São vários os estudos que indicam que é possível considerar como mais agradável aquilo que é incerto, ainda que nem sempre demos por isso. O paradoxo do prazer diz isto mesmo. Em alguma medida, a incerteza e a incapacidade de controlar as situações são importantes na forma como se desfruta a vida (é preferível ler um livro do qual não se conhece como termina). Contudo, nem sempre conseguimos ver isto com clareza porque a vida, efectivamente, carrega com ela, por vezes, demasiadas surpresas.  Existe uma coisa chamada Nível de Estimulação Óptimo que significa que cada pessoa tem um ponto ideal de incerteza. Abaixo deste ponto a vida torna-se demasiado previsível e controlável, caindo-se no aborrecimento.  Acima deste ponto a vida é, pelo contrário, tão imprevisível e incontrolável que causa ansiedade. No fundo apreciamos as actividades que não são nem aborrecidas nem stressantes e que nos conduzem a um estado daquilo que se design por flow ou experiência óptima. Isto significa que para sermos capazes de apreciar a incerteza e a falta de controlo, temos de sentir que a nossa vida é no geral controlável ou seja de que dispomos de uma plataforma firme que nos sustenta. Apenas quando sentimos isto é que estamos receptivos à incerteza e à falta de controlo. Se efectivamente a vida for demasiado stressante e imprevisível, passamos do nosso ponto ideal e deixamos de ser capazes de apreciar o positivo que se encontra na incerteza.

Ora as rotinas são a tal plataforma que nos sustenta (neste ponto o meu interlocutor tinha razão).  Mas está na capacidade de apreciação da incerteza e da ausência de controlo, o prazer que se retira das situações (e neste caso a minha defesa encontrava-se sustentada).


No fundo precisamos da certeza e da incerteza, assim como precisamos de opiniões, de ideias diferentes e de abertura de mentalidade para que as possamos encaixar com a devida humildade. O perigo está no reducionismo dos argumentos, na intolerância para com as ideias dos outros e no fundamentalismo com que se opina. O equilíbrio tudo explica e a tudo se aplica.