Aquilo que me inspira, levo para casa.




1.10.14

Sonho

Estou no meio das escadas, dos 21 degraus contados infinitas vezes. Velhas, madeira gasta, apertadas, de corrimão de ferro a oferecer um tacto áspero, a aparência é igual ao que sempre foi ou ao que a minha memória me permite assegurar que terá sido.  As caixas do correio, num metal cinzento com rebordo a vermelho, surgem em baixo do lado esquerdo de quem entra. A ocuparem a mesma área de outrora e com a mesma intensidade de desgaste. Apenas a luz das escadas está acesa. Um pormenor que distingue de tudo o que a minha lembrança me jura ter sido. 

Eu sei o que está no interior da casa do primeiro andar esquerdo mas nunca subo as últimas escadas. Vejo, prevejo, mas entre o olhar para cima, para a antecâmera da tua porta, e o olhar para baixo, para a entrada exígua, os pés estão imóveis numa quietude imutável.  E assim fico, de luz amarela sobre os ombros, agarrada ao corrimão que se sustenta numa parede caiada engelhada pelo tempo. Nunca abro a porta, nunca te chego a ver, nunca concluo se a casa está como a vivi. As escadas são o porto de abrigo, o que me protege de tudo aquilo que recordo e que antecipo, o espaço que me deixa num suspenso. E é nessa ansiedade, nessa suspensão de movimentos, de pensamentos e de anseios que acordo. E, nessa altura, volto a apagar a luz da escada. 

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